roupas bagunçadas dentro do armário

Adyel Beatriz
2 min readMay 3, 2020

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Existem conversas que marcam a vida. Eu não sou uma pessoa muito boa de memória; um dos meus maiores medos, aliás, é esquecer momentos, fatos, pessoas e conversas. É desesperador pensar que estou esquecendo algo muito importante para mim. Acho que escrever é uma das minhas tentativas de eternizar sentimentos e memórias. Acontece que alguns textos só saem com força ou algum estímulo.

Enquanto tentava encontrar força, o que eu esqueci? O que deixei de escrever? Será que eu me lembro do Rio? Além do requeijão que eu não quero nem pensar no estado, eu não consigo lembrar do que deixei na geladeira de lá. Consigo enxergar as minhas plantas mortas, na pimenteira plantada e cuidada por mim. Morte não é esquecimento, morte exalta a memória, a nostalgia do caminho trilhado.

Percebo que me apego à memória também por medo, medo do fim, medo da perda. É um drama muito bem vivido e cheio de sinceridade. Cada lágrima que escorre é um mar de saudade. A mente, por muitas vezes, é aquele armário em que entulhamos roupas bagunçadas porque vamos receber visita. O quarto fica um charme, mas uma hora aquele armário tem de ser aberto e hora ou outra a gente precisa lidar com aquela bagunça.

Momentos de isolamento trazem à tona nossos piores monstros, nossa pior face. É o momento que nos olhamos e convivemos com nosso melhor e com nosso pior, estando sozinhos ou não. Lutando contra o esquecimento e vivendo das lembranças. A gente sempre sabe que tem algo para arrumar, mas não existe força que impede a vida de seguir, relembrando e esquecendo de alguns detalhes primorosos. A sensação de ‘poder ter sido diferente’ precisa dar espaço ao renovo e às novas lembranças que nunca vão ser iguais dia a pós dia, não importa o esforço feito.

Tudo bem as fotografias, os áudios, as cartas ou textos, as músicas me lembram você. Confronto tudo isso e busco por consolo, não por tristeza ou arrependimento. Foi bom.

Audácia minha querer controlar até o rumo da vida.

A conversa que me marcou aconteceu com a minha amiga Alinne, foi sobre o armário entulhado de roupa, uma mania minha. Talvez o melhor seja escancarar as portas desse armário, enxergar essas roupas bagunçadas, não necessariamente arrumá-las, mas se empoderar dessa bagunça que faz parte de mim. Nem tudo é urgente.

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Adyel Beatriz

despretensiosamente escrevendo e lendo sobre tudo que me interessa e geralmente qualquer coisa me interessa, principalmente tudo. adyelbeatriz.contently.com